:02:01
"A rapariguinha encontrava-se
sentada e queda no confessionário
:02:05
"escutando as botas de seu pai
rasparem como giz
:02:08
"nos velhos degraus da igreja...
:02:10
... enfraquecendo progressivamente
até de todo desaparecerem."
:02:14
"Ela sentia a presença do padre
do outro lado da rede..."
:02:17
Naquela tarde de sexta-feira
em Fevereiro último
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Lia aos meus alunos do "workshop"
de escrita avançada, um texto
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de um tal James Leer, estudante
do penúltimo ano de literatura
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e único habitante
do seu melancólico gulag.
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"Ela mordeu a carne do lábio
e cerrou os olhos...
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... muda."
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As histórias do James eram tão
radiosas quanto a sua disposição.
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Eu estava algo distraído.
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Talvez por a minha mulher
me ter deixado naquela manhã.
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Alguém quer comentar?
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Ou talvez não. Esta não era
a primeira esposa a deixar-me.
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Como de costume, os colegas
de turma do James,
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conscientes da vulnerabilidade
intrínseca de um escritor,
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apresentaram os seus sensíveis
e tolerantes pontos de vista.
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Credo, mas que tara é a vossa,
a dos católicos?
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Pronto! Pronto!
Tentemos ser construtivos, sim?
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- Howard, o que tens a dizer?
- Eu cá detestei.
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As histórias dele dão-me
vontade de me matar.
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Isso não é propriamente o que eu
entendo por construtivo, Howard.
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Sim, Hannah?
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Se calhar, o essencial
está a escapar-nos.
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Hannah Green,
uma escritora de talento
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que alugara um quarto
em minha casa.
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Eu sabia-a perspicaz, amável
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e utilizadora compulsiva
de botas de cowboy vermelhas.
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Aliás, nunca, em ocasião
alguma, a vira sem elas.
:03:43
Ele respeita-nos o suficiente para
nos esquecer e isso requer coragem.
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Bem dito, Hannah.
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E assim fechamos com chave
de ouro a nossa aula.
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Não se esqueçam do Festival
da Palavra este fim-de-semana.
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Quem vai buscar VIPs para os levar
ao cocktail desta noite
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tem de estar em casa da reitora
no máximo até às 5 e meia.