1:10:03
Está muito bem!
1:10:05
Mas por que falais lentamente,
meu amigo?
1:10:08
São hesitantes as vossas
palavras. Porquê?
1:10:11
- Porque é de noite...
- O quê?
1:10:16
Na sombra, às cegas elas avançam
para os vossos ouvidos.
1:10:21
As minhas não sentem
essa dificuldade.
1:10:24
Chegam imediatamente.
1:10:26
É evidente, pois é no meu coração
que as recebo.
1:10:30
Ora eu, tenho o coração grande,
vós a orelha pequena.
1:10:34
Aliás, as vossas palavras
descem, vão depressa,
1:10:40
as minhas sobem, senhora,
precisam de mais tempo!
1:10:43
Mas desde há alguns momentos
elas sobem bastante melhor.
1:10:45
Habituaram-se,
à força do exercício!
1:10:48
De facto, falo-vos
de uma grande altura!
1:10:50
Certamente, e matar-me-íeis se,
dessa altura,
1:10:54
deixásseis cair uma palavra dura
sobre o meu coração!
1:10:56
- Vou descer!
- Não!
1:10:58
Então, trepai até aqui,
rapidamente!
1:11:00
- Não!
- Como... não?
1:11:01
Deixai que a aproveitemos,
1:11:04
esta ocasião
que se nos oferece...
1:11:06
para nos podermos falar
docemente sem nos vermos.
1:11:08
- Sem nos vermos?
- Mas claro, é encantador.
1:11:11
Apenas adivinhamos
a presença um do outro.
1:11:13
Vós vêdes a negrura de um longo
manto que se arrasta.
1:11:15
Eu apercebo-me da brancura
de um vestido de Verão.
1:11:18
Não sou mais que uma sombra,
e vós apenas uma claridade.
1:11:23
E é como se vos falasse
pela primeira vez.
1:11:26
É verdade que tendes uma voz
completamente diferente.
1:11:28
Sim, totalmente diferente,
porque na noite que me protege,
1:11:31
ouso finalmente ser eu mesmo
e ouso...
1:11:37
Onde ia?
1:11:39
Não sei... tudo isto,
perdoai a minha emoção,
1:11:43
é tão delicioso,
é tão novo para mim!
1:11:46
- Tão novo?
- Tão novo...
1:11:48
O ser sincero:
1:11:50
o medo de ser escarnecido,
aperta-me sempre o coração...
1:11:53
- Escarnecido porquê?
- Por um arrebatamento!...
1:11:57
Sim, o meu coração tem sempre
o espírito a cobri-lo, por pudor.