:00:48
Morei e trabalheitoda a minha vida na cidade.
:00:52
O que, vendo bem, é um problema,
:00:55
pois sinto-me sempre malao pé de multidões.
:00:58
A sério. Os espaços fechadosaterrorizam-me.
:01:02
Tudo me faz sentir enclausurado.
:01:05
Passo o tempo a dizera mim próprio
:01:07
que, algures,deve haver algo de melhor.
:01:09
Mas talvez eu pense demasiado.
:01:11
Deve advir de ter tidouma infância ultra-ansiosa.
:01:16
Sabe, a minha mãenunca me deu atenção.
:01:18
Quando somos o filho do meio
:01:21
numa família de 5 milhões
:01:22
ninguém nos liga nenhuma.Nem outra coisa seria de esperar.
:01:26
Sempre padeci de traumasresultantes deste abandono.
:01:29
O meu pai era basicamenteum zangão, como já disse.
:01:33
O gajo deu à asa quandoeu era ainda uma larva.
:01:35
E nem me faça falardo meu emprego,
:01:40
porque não há nadaque me irrite mais.
:01:42
Desde já lhe digoque não nasci para operário.
:01:44
Sinto-me fisicamente inadequado.
:01:47
Nunca na vida consegui levantar
:01:51
mais do que 10 vezeso meu próprio peso.
:01:53
E, na realidade, transportar terra
:01:56
não é bem aquilo a que euchamaria uma carreira gratificante.
:01:59
É toda esta tara pseudo-virilde que somos um super-organismo
anterior.